Há exatos 12 meses, eu deixei Auckland (Nova Zelândia) para morar na cidade pela qual me apaixonei dez anos atrás, em minha primeira viagem à Europa. Eu e meu marido deixamos o país incrível e distante que nos acolheu, deu amigos atenciosos e proporcionou viagens a alguns dos lugares mais lindos que já visitamos. Deixamos nossos empregos em empresas bem sucedidas e onde o nosso trabalho era valorizado: ele, por outra irrecusável oportunidade de trabalho, e eu, pela expectativa de atuar no mercado global e competitivo de Londres.
Foi um ano intenso em todos os sentidos: de encontrar uma casa e se estabelecer numa cidade complexa como essa, de aprender a administrar o tempo e as próprias expectativas, aceitar os NÃOs da rejeição e dizer mais SIMs a novas descobertas. Foi por isso que eu disse sim à querida Joanna, quando ela me convidou para escrever para o Um Ano Sem Zara, esse projeto pessoal corajoso que se tornou uma marca poderosa. Quando ela iniciou seu blog, anos atrás, admitiu para si e expôs publicamente sua vulnerabilidade ao revelar sua compulsão por compras e transformou isso em criatividade, reflexão e rentabilidade. Vale lembrar que a Jô é publicitária, mas o blog gera fontes de renda complementares, permite conhecer gente interessante e discutir a responsabilidade sócio-ambiental da moda, bem como seu uso como meio de expressão individual e empoderamento feminino enquanto negócio.
E por falar em vulnerabilidade, você já deu atenção a isso alguma vez? O que é vulnerabilidade para você e como você a trata? O que já aprendeu com isso?
Até poucos anos atrás, eu era mais o tipo de pessoa que diria: “Vulnerável? Não, nunca fui. Estou bem comigo, obrigada”. E estou certa de que muitos de nós passaram bastante tempo se esforçando para buscar a perfeição em tudo o que fizemos, como se a vida fosse um pódio e só valesse estar no primeiro lugar. Eu fui, ao mesmo tempo, diretora de contas em agências de comunicação e DJ, fazia academia, praticava yoga, lia pelo menos três jornais todos os dias, assistia a filmes, séries e shows, e ainda encontrava tempo para cozinhar e estar com marido, família e amigos.
“Como você consegue fazer tudo isso?”, sempre me perguntavam. Ah, que alimento para o ego! Felizmente, depois de anos batendo a cabeça, gerindo equipes e crises de comunicacão e algum tempo de terapia, aprendi que o melhor, mesmo que doloroso, é reconhecer e expor suas próprias limitações (sim, TODOS temos), aceitar a imperfeição e transformar isso em aprendizado e força. Na verdade, eu estava exausta, tive uma inflamação grave no quadril, sentia falta de ar frequentemente. Passei a pedir ajuda ou aconselhamento mais vezes, a delegar mais e a deixar de querer ser uma pessoa multitarefas, buscando, principalmente, estar mais presente em cada uma das minhas atividades, uma por vez. A resposta foi imediatada: eu me senti mais leve, mais criativa, mais confiante e mais feliz.
Especialista em vulnerabilidade e autora de alguns dos livros mais vendidos sobre o assunto no mundo todo, a pesquisadora Brené Brown foi a minha leitura de cabeceira nesse último ano. Após 12 anos de pesquisa sobre o tema, ela chegou à conclusão de que as pessoas que mais acreditam em si e encontraram o sentimento de pertencimento são aquelas que tiveram a coragem de serem imperfeitas, que são gentis consigo mesmas, perdoam-se por erros cometidos e que são apenas quem elas querem ser, e não aquilo que elas acham que deveriam ser. Na conclusão dela, essas pessoas abraçaram a sua vulnerabilidade, permitindo que outras vissem quem elas realmente são, gerando então identificação e engajamento. What makes you vulnerable, makes you beautiful (O que te faz vulnerável, te faz bonita (o)). Assista aqui a essa verdadeira aula dela sobre o assunto e um dos TEDtalks mais vistos de todos os tempos.
Agora, já morando fora do Brasil há dois anos e meio, percebi que precisava acessar a minha vulnerabilidade novamente: falando abertamente sobre as consequências da minha segunda mudança de país (como recomeçar outra vez em um mercado em que sou imigrante e ainda não tenho uma rede de contatos consolidada, o que é fundamental para um profissional da minha área) e dando espaço para o novo acontecer (atuar como freelancer, prospectar e diversificar as entregas de trabalho, por exemplo). Nos últimos 15 anos, eu havia trabalhado com Relações Públicas e Comunicação Corporativa em empresas de diferentes culturas, mas sempre pertencendo a algum lugar, com meu título no LinkedIn garantido e uma carteira de clientes invejável. Hoje, há um ano fazendo trabalhos como profissional independente, construindo uma nova rede de contatos, estudando e trabalhando na minha recolocação profissional aqui em Londres, posso dizer que o momento em que me vi mais vulnerável (ou exposta) foi me encontrar sem um título ou uma única posição profissional que definisse quem sou e o que posso fazer – como se isso fosse a única coisa que definisse uma vida inteira, só porque essa era a única Juliana que eu conhecia. Vamos combinar que, com tanta coisa para fazer e pratinhos para equilibrar, eu havia dedicado pouco tempo ao meu autoconhecimento. Parece simples de resolver, mas só quem viveu essa intersecção sabe o quanto isso pode ser desafiador, frustrante e enriquecedor, tudo ao mesmo tempo. Desapegar dos meus rótulos anteriores e estar disposta a encontrar novos EUs e novas possibilidades para mim foi o maior aprendizado que tive nesse período.
Reencontrei e acolhi a minha vulnerabilidade. Sigo em busca de respostas. Mas mudei as perguntas. Eis que encontrei não um, mas alguns caminhos para aplicar o meu conhecimento, a minha energia e as minhas paixões. Escrever aqui para vocês foi uma das respostas que encontrei para ampliar os meus talentos e as minhas possibilidades. Acredito que todos nós deveríamos dividir nossas dúvidas, dificuldades e experiências para, assim, aprender, abrir portas e ajudar a encontrar o que há de vulnerável e bonito uns nos outros.
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Juliana Decanine é uma brasileira do interior de São Paulo que vive em Londres. Nunca foi de uma tribo só: formou-se em Relações Públicas pela Unesp, estudou Branding na FGV, discotecagem no Senac e corte e costura no CityLit. É DJ de rock, electro rock, indie rock, nu disco e música brasileira. Ama a Estação da Luz em São Paulo, o bom humor do carioca e o céu azul da Nova Zelândia.