Precisamos falar sobre o clima
12 de Abril de 2019 POR Jojo COMENTA AQUI!

Essa semana chuvas intensas trouxeram o caos pra cidade do Rio de Janeiro. À distância, assisti horrorizada os registros da destruição feitos por amigos e parentes que, graças a Deus, se encontravam em segurança. Teve gente que não teve tanta sorte. O temporal que abalou a cidade causou a morte de 10 pessoas, além de ter deixado um rastro de alagamentos e destruição.

Mês passado, Moçambique foi atingido por um ciclone que destruiu casas, hospitais, lavouras, estradas e matou mais de mil pessoas. MIL pessoas.

Estamos falando de eventos climáticos devastadores que estão se tornando cada vez mais comuns e, infelizmente, cada vez mais devastadores. E eis que surge a pergunta: quão naturais são as tragédias que a gente anda vendo assolar diversas partes do mundo com mais frequência e mais intensidade?

Ok, a pergunta era retórica e a resposta um tanto óbvia. Não, não tem nada de natural nos fenômenos ditos naturais que estão rolando por aí.

Pra mim essa é uma história de três partes. Vamos a elas.

A primeira parte é: o aquecimento global é uma realidade.

Ele está acontecendo e já está sendo responsável por mudanças drásticas no clima. Isso é um fato, quer você queira admitir ou não.

No final de 2018 foi divulgado um relatório da ONU sobre os efeitos devastadores que um aumento de temperatura maior do que 1,5 graus irá causar para a saúde e bem estar da humanidade, bem como aos ecossistemas e biodiversidade do planeta. O documento alerta que ainda há tempo pra reverter o quadro, mas pra que isso aconteça é preciso que mudanças drásticas e sem precedentes sejam tomadas. Em termos práticos, estamos falando de uma diminuição de quase 50% até 2030. Ou seja, temos pouco mais de 11 anos pra resolver esse pepino.

Qualquer aumento acima do patamar de 1,5 graus vai causar danos irreparáveis e mudar drasticamente o mundo que a gente vive. Estamos falando de degelo completo das calotas polares e aumento nos níveis de oceano a ponto de deixar países inteiros debaixo d’água, criando uma nova crise de refugiados climáticos.

Estamos falando do desaparecimento absoluto das barreiras de corais, aumento de doenças tropicais e avanço dessas doenças pra outros territórios, além do aumento da intensidade e frequência de eventos climáticos drásticos.

A segunda parte é: governos precisam se preparar melhor para o que já está acontecendo e vai continuar a acontecer.

Todo ano é a mesma coisa. Chega Março e chove no sudeste do Brasil. Não dá pra fingir surpresa. Também não dá pra fingir surpresa que as chuvas estão ficando cada vez piores.

Não dá pra se preparar pensando nas chuvas que caíram no ano passado. É preciso se preparar para um ano que vem que provavelmente será mais sombrio do que esse que passou.

Precisamos cobrar do pessoal que está no poder planos efetivos de prevenção e contingência. Precisamos eleger governantes que dêem prioridade à pasta do meio ambiente. Sim, o Brasil tem muitos problemas, educação, saúde, violência, mas o meio ambiente e o planejamento urbano sustentável não podem ser considerados assuntos supérfluos, para serem resolvidos depois. Pessoas estão morrendo, perdendo suas casas, seus negócios.

Talvez se políticos estivessem menos preocupados em beneficiar o próprio bolso e garantir suas reeleições, sobrava tempo e dinheiro pra olhar pra esse assunto com mais afinco e evitar que novas catástrofes aconteçam.

E eis que chegamos à terceira parte dessa história: você também é responsável por tudo isso.

Preciso frisar esse ponto porque vi muita gente nos últimos dias colocando a culpa de tudo o que aconteceu no Rio no governo. E, sim, como fiz questão de frisar aqui em cima, o governo tem MUITA responsabilidade nessa tragédia. Mas ouvi pouca gente virando o dedo pra si próprio e reconhecendo sua parcela de culpa, não só no que aconteceu no Rio, mas no que está acontecendo no mundo.

Um dos pontos levantados pelo relatório da ONU fala justamente sobre as transformações radicais no modo como a gente vive, desde as fontes energéticas que utilizamos aos alimentos que consumimos, pra conseguir atingir a meta.

“Ah, Jô mas eu sou só uma pessoa! O que eu faço não vai fazer nem cócegas no mundo.”

Faz sim. Larga de ser pessimista e preguiçosa. O esforço de todo mundo faz diferença. E num mundo cada vez mais conectado, o seu esforço pode ser inspiração pro esforço de outras pessoas.

Quer prova maior do que Greta Thunberg? Uma menina de 16 anos acaba de ser uma das indicadas para receber o Prêmio Nobel da Paz por seus esforços para combater as mudanças climáticas. Greta ficou conhecida globalmente em Agosto do ano passado, quando, numa sexta-feira, resolveu faltar a escola e ir sentar sozinha na calçada na frente do Parlamento Sueco empunhando um cartaz que dizia: skolstrejk för klimatet, em português “greve escolar pelo clima”. A ideia de Greta era pressionar o governo Sueco a se comprometer com mudanças efetivas.

Apenas oito meses se passaram desde esse primeiro protesto, mas o gesto de Greta e o comprometimento dela com a causa hoje reverberam pelo mundo. No dia 15 de março, o movimento FridaysforFuture (Sextas para o Futuro) reuniu dezenas de milhares de adolescentes em mais de 1700 atos coordenados de greve escolar ao redor do planeta. Os estudantes tomaram as ruas para chamar a atenção para a pauta das mudanças climáticas.

Eu não tô falando que você precisa ser a Greta, mas peço que olhe para as suas atitudes e entenda o que você pode mudar na sua rotina pra fazer a sua parte.

Eu tenho pensado cada vez mais nisso. Me envergonho por ainda não fazer todas as coisas que poderia estar fazendo, mas tô tentando mudar meus hábitos, me informar mais e promover mudanças consistentes e permanentes na minha vida. Há alguns anos postei aqui no blog sobre o movimento Segundas sem Carne, por exemplo. Ainda não me tornei vegetariana (adoraria conseguir chegar lá num futuro breve), mas diminuí muito o meu consumo de carne (e hoje não me apego às segundas-feiras). Se você não tem consciência sobre a relação direta entre o consumo de carne e o aquecimento global, dá uma olhadinha nessa matéria de 2016 que mostra que, no Brasil, a pecuária é a atividade econômica que mais contribui para a emissão de gases que causam alterações climáticas.

Mas nesse post aqui eu queria focar nos nossos hábitos de consumo de moda e como eles também podem estar contribuindo pra esse cenário desastroso que a gente vê por aí. A imagem abaixo mostra o peso em quilos da pegada de carbono deixada pelas roupas que a gente usa diariamente.

Então, aqui vão algumas mudanças pra você pensar em começar a incorporar na sua rotina de consumo de moda e que vão com certeza ter um impacto positivo no mundo.

(eu sei que o post já tá enorme, mas hoje eu tô inspirada, então sigamos em frente. Se quiser ir pegar uma água, vai lá que eu te espero)

COMPRAR DE PRODUTORES LOCAIS

Comprar de quem produz lá na China não é só uma questão social que, muitas vezes, envolve trabalhadores em trabalhando em condições péssimas e recebendo uma mixaria. Comprar uma peça que foi produzida do outro lado do mundo também significa um esforço muito maior pra que ela chegue até você, ou seja, mais emissão de CO2, que gera mais aquecimento global.

Comprar de produtores locais (não tô falando só da lojinha ser local, tô falando de gente que produz e vende na sua cidade, estado, região) contribui pra encurtar as distancias entre você e onde essa peça foi produzida, diminuindo a pegada de carbono dessa compra. Fora que é muito legal pra economia local também.

NÃO CRIAR O HÁBITO DE FICAR DEVOLVENDO ROUPA

Aqui na Europa e nos EUA, virou hábito fazer compras enormes de roupas pela internet e depois mandar de volta pelo correio tudo o que não ficou bom. Além de ser um hábito que acaba incentivando o consumo de um bando de coisa desnecessária, o envio de volta significa que todo o gás carbônico necessário pra fazer aquela peça chegar até você vai ser dobrado. Fora o lixo (caixas, papel, plástico) gerado à toa nesse processo.

Então bora pensar bem antes de comprar as coisas? O seu bolso vai agradecer e o planeta também.

EVITAR PEÇAS DE FIBRA SINTÉTICA 

A queima de combustível fóssil é um dos vilões do aquecimento global. Combustível fóssil é usado pra que? Entre outras coisas as fibras sintéticas, como poliéster, poliamida e acrílico. Além de serem tecidos que esquentam pra caramba o corpo (o que já seria motivo suficiente pra você fugir delas no Brasil), as fibras sintéticas ainda são responsáveis pela liberação de milhares de micro plásticos nos oceanos a cada lavagem.

EVITAR A VISCOSE

Em seu livro “Moda Ética Para Um Futuro Sustentável”, a autora Elena Salcedo explica que a fibra de viscose é produzida através da extração da celulose de árvores. O problema é que, diferente da fibra de bambu e do liocel, cerca de 30% da viscose produzida para virar roupa é proveniente de árvores de florestas nativas e ameaçadas de extinção, incluindo a Amazônia.

Ou seja, é bem fácil fazer o paralelo viscose = desmatamento. Esse post do Modefica, explica direitinho essa e outras razões pelas quais a proliferação desse tecido (hoje o terceiro mais usado pela indústria têxtil) é tão preocupante.

Pra não compactuar com isso, opte por tecidos como o Liocel e a fibra de bambu que também são tecidos artificiais leves e ótimos pra climas tropicais como o do Brasil.

FICAR ATENTO ÀS PEÇAS DE ALGODÃO QUE VOCÊ COMPRA

1 em cada duas peças de roupa no mundo são feitas de algodão. E apesar dele ser ser uma fibra natural vinda de uma fonte renovável, o cultivo e produção de algodão exige MUITA água. Fora isso, muitas vezes esse algodão é cultivado em países de terceiro mundo, sem a infra estrutura correta para evitar maiores desperdícios.

Uma boa alternativa é procurar marcas que colaboram com a Better Cotton Initiative (no Brasil a C&A é uma delas). A iniciativa trabalha com fazendeiros ao redor do mundo promovendo práticas mais sustentáveis para reduzir o impacto da produção de algodão no meio ambiente.

COMPRE PEÇAS DE QUALIDADE E CUIDE PARA QUE ELAS DUREM

Lidar com roupa como se fosse um negócio descartável que a gente pode comprar baratinho e jogar fora depois de dois ou três usos é muito ruim pra todo mundo (menos pros gigantes das fast fashion que ficam ganhando dinheiro às suas custas).

Então invista em peças de qualidade, com bons tecidos e bom acabamento e cuide bem pra que elas durem! Isso significa lavar menos, respeitar as instruções de lavagem e guardar elas direitinho.

COMPRAR MENOS

O setor de vestuário representa cerca de 3% das emissões globais de CO², principalmente por conta do uso de energia para produzir as roupas.

Aí você junta isso com o fato das fast fashion estarem produzindo cada vez mais roupas de baixa qualidade e incentivando as pessoas a comprarem num ritmo cada vez mais frenético. É a receita de um desastre.

Mesmo que você escolha uma peça com tecido mais sustentável, nada será mais sustentável do que se essa peça não tivesse sido produzida pra começo de conversa.

Melhor alternativa é apostar numa peça que já estava aí pelo mundo, num brechó, no armário de uma amiga, num site de peças de segunda mão.

Essas foram só algumas ideias pra te fazer começar a repensar a relação entre as roupas que você compra e os eventos climáticos que tanto afetam as nossas vidas (e mais ainda as vidas de comunidades mais vulneráveis ao redor do mundo).

Te incentivo a ir além e pensar em outras áreas da sua rotina em que pequenas mudanças também podem fazer grandes diferenças. E depois vem me contar aqui nos comentários o que você anda fazendo pra contribuir positivamente pra essa história.